Escolher por onde começar a ler Machado de Assis é uma dúvida muito comum entre leitores. O autor é considerado o maior nome da literatura brasileira. O escritor criou obras extremamente ricas e complexas, que falam tanto com os leitores iniciantes quanto com os mais experientes.
Neste artigo, vamos te guiar em seu universo literário. Vamos conhecer seu estilo irônico e filosófico e entender por que cada leitura é única.
Vamos apresentar trilhas de leitura para diferentes tipos de leitores. Isso inclui desde os leitores casuais até os acadêmicos. Também teremos um plano prático de 30 dias para aprender o essencial sobre o autor.
Ao longo do texto, analisamos contos importantes como A Cartomante, Missa do Galo e O Alienista. Também falamos sobre romances essenciais como Memórias Póstumas de Brás Cubas, Quincas Borba e Dom Casmurro.
Além disso, mostramos como cada um deles revela humor, crítica e introspecção. Por fim, você encontrará dicas de leitura, edições comentadas e traduções recomendadas. Tudo isso para te ajudar a entender melhor o universo machadiano. Continue lendo e compartilhe esse artigo com outros leitores!
Por onde começar a ler Machado de Assis?

Escolher por onde começar a ler Machado de Assis é uma dúvida comum. Isso acontece tanto com leitores iniciantes quanto com leitores mais experientes.
Os livros do escritor são um grande mosaico, cheio de camadas e jogos de linguagem. Cada romance ou conto oferece uma experiência única, que pode ser divertida ou profunda.
Um autor com múltiplas camadas
A estilo de escrita de Machado de Assis pode ser entendida de duas formas:
- A primeira é mais leve e imediata. Aqui, a ironia, o humor e o estilo narrativo se destacam. O leitor pode se encantar pelo estilo sem precisar entender todas as referências deixadas pelo autor.
- A segunda exige um pouco mais de esforço. Ela convida o leitor a interpretar criticamente as referências escondidas e as conexões entre literatura, filosofia, história e cultura.
Essa diversidade vem do que muitos chamam de um palimpsesto literário. Dessa forma, dá para interpretar as obras como um texto sobreposto, cheio de rasuras e reescritas. Cada leitura traz novos significados e mostra que não há um único jeito de explorá-la.
Não há um único caminho
A estrutura fragmentada de livros como Memórias Póstumas de Brás Cubas já mostra esse estilo. O leitor pode apenas apreciar a história. Ele pode rir da sátira e das situações engraçadas. Ou pode explorar os mistérios. Assim, ele descobre as camadas filosóficas e críticas presentes no livro.
Dessa forma, existe uma abertura que desafia o leitor a escolher seu próprio caminho. O resultado é que cada obra se torna um ponto de partida, dependendo das expectativas e do envolvimento de cada um.
Por isso, não há um “livro ideal” para começar. Alguns leitores podem gostar dos contos curtos e bem-humorados, enquanto outros preferem romances densos como Dom Casmurro ou Memórias Póstumas.
O que quero demonstrar nesse tópico é que a experiência de leitura de Machado de Assis é sempre pessoal. Marcada pelo prazer literário e pela reflexão crítica.
Assim, cada leitor deve criar o seu próprio caminho na obra. Eles devem descobrir, em cada página, a riqueza que faz desse escritor o maior da literatura brasileira.
Trilha de leitura para cada perfil de leitor
Os livros de Machado de Assis oferecem várias formas de leitura. Eles se adaptam a diferentes perfis e níveis de experiência. Cada leitor pode seguir um caminho próprio. Pode ser guiado pela leveza da ironia de seus contos ou pela profundidade dos romances.
Sempre há novas camadas de sentido a serem descobertas. Já que o autor combina humor, crítica e reflexão filosófica. Isso atrai desde o leitor iniciante até o estudioso mais experiente.
Rotas de leitura para cada tipo de leitor

A diversidade nos livros de Machado permite que cada leitor encontre um caminho que se encaixe em seu tempo e interesse. A seguir, estão sugestões de leitura para diferentes tipos de leitor:
O leitor casual Leitor
Para quem busca uma entrada rápida e divertida, os contos curtos são a melhor escolha. Algumas coletâneas como:
- Papéis Avulsos (1882)
- Histórias sem data (1884)
- Várias histórias (1896)
Nelas, destacam-se contos famosos como A Cartomante e Missa do Galo. Esses contos mostram o humor, a ironia e a sutileza psicológica do autor em histórias breves e impactantes.
O estudante
Para quem o leitor que está se preparando para exames ou quer entender o essencial do autor, duas obras são essenciais:
- Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881): marca o início do Realismo no Brasil. O “defunto-autor” é conhecido pela ironia e crítica à sociedade.
- Dom Casmurro (1899): romance narrado por Bentinho. O mistério da suposta traição de Capitu é um grande tema da literatura brasileira.
Essas obras são comuns em vestibulares e muito estudadas.
Leitores interessados na evolução do autor
Para quem quer acompanhar o desenvolvimento do autor, uma leitura cronológica é o ideal:
- Primeira fase (romântica): Ressurreição (1872), A Mão e a Luva (1874), Helena (1876), Iaiá Garcia (1878). Essas obras ainda estão ligadas ao Romantismo, mas já mostram sinais de ironia e crítica social.
- Segunda fase (realista): Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891), Dom Casmurro (1899). Aqui, o estilo irônico, fragmentário e crítico se consolida.
Leitores internacionais
Machado de Assis é amplamente conhecido e estudado fora do Brasil, contando com traduções que ampliaram sua recepção. Entre as principais estão:
- Memórias Póstumas de Brás Cubas (Posthumous Memoirs of Brás Cubas) e Dom Casmurro, traduzidos por editoras como Rizzoli e UTET.
- Antologias de contos, como La cartomante e altri racconti, que mostram ao leitor estrangeiro o lado mais lúdico e crítico do autor.
Para os estrangeiros, as coletâneas de contos são uma boa maneira de conhecer Machado de Assis. As traduções confiáveis também ajudam a entender sua riqueza estética e intelectual.
Comece pelos contos de Machado de Assis

Começar pelos contos de Machado de Assis é uma ótima maneira de conhecer o universo do autor. Em poucas páginas, o autor mistura humor, ironia, crítica social e profundidade psicológica.
Isso dá uma ideia do que ele desenvolve em seus grandes romances. As narrativas curtas são fáceis e envolventes, permitindo que novos leitores experimentem o seu estilo sem perder a qualidade literária.
Por que os contos são bons para começar?
Os contos são uma síntese do mundo machadiano. Eles oferecem um contato rápido e prazeroso com o autor. Além disso, trata de dilemas humanos, contradições sociais e o conflito entre razão e loucura que marcam sua escrita.
Isso mostra como o autor une leveza e profundidade, sendo uma boa pedida para quem está começando com o hábito da leitura. Aqui está algumas sugestões de contos e análises:
- O Alienista (1882, Papéis Avulsos): Acompanhamos a história do médico Simão Bacamarte que criou a Casa Verde em Itaguaí para estudar a loucura. Ele interna quase toda a cidade e conclui que a verdadeira normalidade é o desequilíbrio, libertando os pacientes e internando a si mesmo. Um exemplo clássico da ironia crítica de Machado de Assis. O conto explora os limites entre razão e loucura, ciência e poder, misturando humor, filosofia e crítica social.
- A Cartomante (1884, Várias Histórias): Rita tem um caso com Camilo, mas é casada com Vilela. Ao consultar uma cartomante, ela recebe a promessa de segurança. Camilo também visita a vidente e ouve o mesmo. No entanto, ao visitar Rita, é surpreendido e morto por Vilela. O conto mostra o ceticismo do autor em relação às ilusões humanas. A história revela a fragilidade da confiança e a ironia do destino, com uma reviravolta final que é a marca registrada do autor.
- Missa do Galo (1893, Páginas Recolhidas): O jovem Nogueira passa a noite de Natal conversando com Conceição, uma mulher casada. Nada explícito acontece, mas o clima de desejo e dúvida cria uma tensão psicológica. O conto é um bom exemplo da arte da sugestão em Machado. O que não é dito é mais importante do que o que é falado. Isso demonstra a habilidade do autor de explorar o que é implícito e psicológico.
- A Causa Secreta (1885, Várias Histórias): Fortunato é um homem que encontra prazer no sofrimento dos outros. Sua relação com a esposa Maria Luísa e com o amigo Garcia revela frieza e perversidade. O clímax do conto ocorre quando ele se alegra com a dor de um animal ferido. Sem sombra de dúvidas é um dos cantos mais sombrios e cruéis do autor, explorando a maldade humana e o sadismo.
Por que os contos funcionam como transição para as outras obras?
Os contos funcionam como porta de entrada e também como pontes narrativas para os romances mais longos. Obras como Helena e O Alienista assumem bem esse papel.
- Helena (1876): Faz parte da fase romântica do autor. O romance é marcado por amor proibido, dilemas morais e destino trágico. Também traz críticas às convenções sociais da elite carioca, antecipando o estilo psicológico e irônico da fase realista.
- O Alienista (1882, Papéis Avulsos): Conto longo que combina humor, crítica social e filosofia, explorando o tema da loucura e do poder. É mais complexo que um conto curto, porém, é mais acessível que os grandes romances.
- Transição: Já em Helena é possível notar a mudança de foco do romantismo para uma análise mais psicológica. Enquanto O Alienista amplia a narrativa curta para discussões universais. Essas obras mostram como Machado de Assis se desenvolveu como escritor. Além disso, elas preparam o leitor para livros mais complexos, como Memórias Póstumas de Brás Cubas e Quincas Borba.
Começar pelos contos machadianos é uma escolha inteligente. Eles mostram de maneira rápida e impactante os principais recursos do autor. Esses recursos ajudam a entender os romances realistas. Nesses romances, a crítica social e a ironia se tornam mais desenvolvidas.
Próximo passo: os grandes romances machadianos

Os grandes romances de Machado de Assis são considerados o auge de sua produção literária. Eles mostram um realismo crítico e filosófico que o coloca entre os maiores escritores do mundo.
Obras como Memórias Póstumas de Brás Cubas, Quincas Borba e Dom Casmurro marcam a transição do Romantismo para o Realismo. Além disso, também mostram a habilidade do escritor em usar a narrativa para criar dúvida, ironia e crítica social.
Memórias Póstumas de Brás Cubas: A revolução narrativa
Publicado em 1881, Memórias Póstumas de Brás Cubas é um marco na literatura brasileira. É o início da trilogia realista de Machado de Assis.
- Inovação formal: o romance apresenta o defunto-autor, um narrador que já está morto e escreve suas memórias do além. Esse recurso quebra os padrões tradicionais do romance do século XIX e dá liberdade à narrativa, sem seguir uma ordem ou moralidade.
- Estrutura fragmentada: os capítulos são curtos e cheios de ironia. O narrador quebra a quarta parede e conversa diretamente com o leitor.
- Narrador não confiável: Brás Cubas é cínico e irônico. Ele zomba de si mesmo e da elite escravocrata do século XIX.
O livro é uma crítica à modernidade falsa do Segundo Reinado. Ela expõe a hipocrisia da elite e questiona os valores da sociedade. Personagens como Prudêncio, um ex-escravo, e Quincas Borba, criador do Humanitismo, ampliam a crítica social e filosófica.
O impacto de Memórias Póstumas de Brás Cubas está em transformar o romance em um instrumento de reflexão. Machado não copia a realidade, mas a questiona.
Quincas Borba: Crítica social e filosofia do Humanitismo
Publicada em 1891, a obra continua a fase realista e aprofunda a crítica social com a filosofia satírica do Humanitismo.
- Enredo: A história segue Rubião, um professor que herda a fortuna e o cachorro de Quincas Borba. Ingênuo, ele é manipulado por Cristiano e Sofia Palha. Com o tempo, perde sua fortuna, a razão e a dignidade, terminando na miséria com seu cão.
- Humanitismo: É uma filosofia fictícia criada por Quincas Borba. Seu lema é “ao vencedor, as batatas”. A doutrina imita as ideias científicas do século XIX. Ela defende a competição social como uma lei natural. Além disso, mostra o absurdo da filosofia ao justificar a exploração.
- Crítica social: O fim de Rubião simboliza a vulnerabilidade do indivíduo diante da elite competitiva e brutal do Segundo Reinado. A fachada civilizada esconde relações de interesse, desigualdade e poder.
O estilo reúne ironias, análise psicológica e sátira, transformando a história de Rubião em uma metáfora das contradições da sociedade brasileira.
Quincas Borba leva a ironia de Machado a um nível filosófico. Ele desmonta os ideais científicos da época e a falsa civilidade da elite.
Dom Casmurro: Ciúme, memória e dúvida
Publicado em 1899, Dom Casmurro é um dos romances mais conhecidos da literatura brasileira. Ele se destaca pela construção psicológica de seus personagens e pela ambiguidade da narrativa.
- Contexto histórico: escrito no fim do Segundo Reinado, o romance reflete as contradições de uma sociedade patriarcal e escravocrata. Essa sociedade copiava modelos europeus, mas mantinha as mesmas estruturas de poder.
- Enredo: A história é narrada por Bentinho (Bento Santiago) já velho, lembrando de sua vida. Ele conta do seu amor por Capitu e seu casamento destruído pelo ciúme e pela suspeita de traição. A dúvida sobre a paternidade de Ezequiel, filho do casal, consome Bentinho e marca sua ruína.
- Capitu: uma das personagens mais controversas da literatura brasileira. Seus famosos “olhos de cigana oblíqua e dissimulada” simbolizam a dúvida presente na obra. Tudo que o leitor sabe sobre ela chega pelo olhar ciumento de Bentinho, um narrador pouco confiável.
- Ambiguidade narrativa: a grandeza de Dom Casmurro está na dúvida que não se resolve, afinal, Capitu traiu ou não Bentinho? A narrativa em primeira pessoa conta mais sobre o ressentimento de Bentinho do que sobre a verdade.
A genialidade do romance transforma uma simples história de ciúme em uma reflexão sobre memória e subjetividade. Em Dom Casmurro, Machado de Assis consagra o seu estilo realista e irônico. E criando um enigma literário que permanece vivo até hoje.
Com esses três livros, Machado de Assis consolida sua fase realista e traz um romance moderno, crítico e ambíguo.
A leitura cronológica: acompanhando a evolução do autor

Seguir uma ordem cronológica ajuda a entender a evolução do escritor. Ele começou com romances românticos e chegou ao realismo crítico e filosófico. Seguir essa ordem é mais do que ler livros. É observar um processo de mudança do escritor e o que o tornou um gigante da literatura brasileira.
Na primeira fase, obras como Ressurreição (1872), A Mão e a Luva (1874), Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878) se destacam. Esses romances falam de amores difíceis, dilemas familiares e comportamento social, ainda no estilo Romântico. Porém, já nessas obras, aparecem os sinais da originalidade do autor, como a observação psicológica e a crítica social.
Depois, temos as obras intermediárias, com O Alienista (1882) em destaque. Embora seja uma novela, a obra mostra a ambição crítica dos grandes romances. Ela antecipa a ironia que virá na fase madura de Machado.
A grande mudança ocorreu em Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881). Este livro marca o início do realismo machadiano. O narrador “defunto-autor”, os capítulos curtos e a crítica social mostram a ruptura com o Romantismo. Aqui, Machado cria um realismo único, introspectivo e filosófico.
Em seguida, surge Quincas Borba (1891) que aprofunda a crítica social e filosófica com a ideia do Humanitismo. O percurso termina em Dom Casmurro (1899). Aqui, o ciúme, a dúvida e a ambiguidade narrativa estão no auge.
Com Bentinho e Capitu, o autor cria personagens de grande complexidade psicológica. O romance é marcado pela fragmentação da narrativa e pelo subjetivismo. Assim, podemos traçar uma ordem cronológica com foco na mudança de estilo do autor:
- Ressurreição, A Mão e a Luva, Helena, Iaiá Garcia: fase romântica, com sinais de crítica e psicológica.
- O Alienista: obra intermediária, com sátira e reflexão filosófica.
- Memórias Póstumas de Brás Cubas: ruptura com o Romantismo e início do realismo crítico.
- Quincas Borba: aprofunda a crítica social e filosófica com o Humanitismo.
- Dom Casmurro: a maturidade do autor, com foco na subjetividade e na ambiguidade narrativa.
Essa progressão mostra as mudanças na escrita do escritor. Ele começou com romances românticos. Depois, sua escrita se tornou mais irônica, analítica e transformadora. Por fim, ele alcançou a maturidade em sua fase realista.
Plano de leitura de 30 dias: um roteiro prático

Montar um plano de leitura de 30 dias é uma maneira fácil e divertida de conhecer o universo machadiano. Esse plano mistura contos curtos, novelas e romances que revolucionaram a literatura brasileira. Essa abordagem ajuda a evitar o medo da complexidade das obras e oferece uma experiência gradual e profunda.
Dias 1–10: Contos essenciais
Sem sombra de dúvidas os contos são a melhor maneira de começar. Em poucas páginas, é possível encontrar ironia, crítica e análise psicológica. Alguns dos contos mais recomendados são:
- A Cartomante: mostra o ceticismo do autor sobre as ilusões humanas, com um final irônico.
- Missa do Galo: fala sobre a sutileza psicológica e o que não é dito, onde os silêncios falam mais que as palavras.
- A Causa Secreta: mostra o lado sombrio da condição humana, com a maldade de Fortunato, que antecipa debates sobre o inconsciente.
- O Alienista (conto longo): traz uma sátira divertida e ironia.
Esses contos ajudam o leitor a entender o humor, a ambiguidade e a crítica, que são marcas do estilo de Machado.
Dias 11–17: O Alienista
Publicado em 1882, O Alienista é importante entre os contos e os grandes romances. No conto acompanhamos a história do médico Simão Bacamarte. Ele cria a Casa Verde em Itaguaí para estudar a linha entre razão e loucura. No começo, ele interna apenas os considerados insanos, mas depois inclui quase todos os cidadãos. No final, ele conclui que a loucura está em quem se acha equilibrado.
A história mistura humor, sátira e reflexão filosófica. É uma ponte entre os contos e os romances mais complexos. A leitura é leve, mas crítica, preparando o leitor para a fase realista.
Dias 18–30: Memórias Póstumas de Brás Cubas
Publicado em 1881, Memórias Póstumas de Brás Cubas inaugura a entrada do escritor no realismo. Contado por um defunto-autor, Brás Cubas, o livro quebra a linearidade e a estrutura padrão das obras realistas da época. Essa estrutura permite uma leitura diária em pequenas partes, sem perder o impacto.
No livro, o leitor acompanha:
- a infância mimada de Brás Cubas,
- sua juventude sem propósito,
- os amores com Marcela e Virgília,
- a carreira política mal sucedida,
- a criação do famoso “emplasto anti-hipocondríaco”, símbolo de sua vaidade,
- e a última e famosa reflexão do personagem, de que não deixou filhos, escapando, assim, de passar “o legado da nossa miséria”.
A leitura em treze dias permite absorver a ironia, a metalinguagem e a crítica social sem sobrecarregar o leitor.
Dicas práticas de como ler Machado de Assis

Ler as obras de Machado de Assis é mais do que seguir boas histórias. É um exerccio de interpretação. Suas narrativas são cheias de camadas, de ironias, de silêncios e contradições.
Isso exige uma participação ativa do leitor. Por isso, usar práticas de leitura ativa torna a experiência mais rica. Dessa forma, extraímos tanto a diversão quanto a profundidade filosófica e social de seus textos.
Faça anotações durante a leitura
Os capítulos curtos de Memórias Póstumas de Brás Cubas e os contos são ótimos para registrar impressões, citações marcantes e reflexões pessoais. Esse hábito ajuda a destacar partes em que o escritor desmonta ilusões sociais ou mostra contradições históricas. Um exemplo é o contraste entre a modernidade de fachada e a escravidão no Brasil do século XIX. Outra prática útil é relacionar temas em contos e romances. Nos contos, por exemplo:
- Em Missa do Galo, vemos a força do silêncio e da sugestão.
- Em A Cartomante, aparece o destino irônico e a credulidade humana.
- Em A Causa Secreta, a perversidade está escondida sob uma aparência respeitável.
Esses elementos aparecem em outras obras. O ciúme obsedante de Bentinho em Dom Casmurro ou a crueldade social justificada pelo Humanitismo em Quincas Borba. Comparar essas conexões ajuda a entender a coerência e a evolução do projeto literário do escritor brasileiro.
Atenção às estratégias narrativas
Em O Alienista, é bom anotar as inversões lógicas de Simão Bacamarte e as mudanças de perspectiva do narrador. Esses recursos transformam a sátira em crítica às instituições científicas e políticas.
Em Memórias Póstumas de Brás Cubas, a leitura lenta dos capítulos ajuda a entender as interrupções, diálogos com o leitor e fragmentação narrativa. Comparar esses recursos com os primeiros romances do autor iniciais mostra como ele rompeu com a linearidade romântica. Além disso, é possível notar a construção do seu realismo que é filosófico, irônico e inovador.
Preste atenção à ironia
A ironia é uma das marcas do autor. Ela não serve só para divertir, mas também para criticar, questionar certezas e mostrar contradições. Dessa forma, podemos perceber ela:
- Nos contos, a ironia desmonta ilusões humanas:
- Em A Cartomante, a fé no destino é destruída por um final trágico.
- Em Missa do Galo, o silêncio e as insinuações ironizam os costumes da época.
- Em A Causa Secreta, a crueldade de Fortunato mostra a hipocrisia social.
- Em obras como O Alienista, a ironia é filosófica e satírica. A figura de Simão Bacamarte mostra como a ciência pode ser usada de forma errada, transformando o poder em loucura.
Nos grandes romances, notamos a ironia atingir seu auge:
- Em Memórias Póstumas de Brás Cubas, o narrador faz humor sobre sua vida sem sucesso. Ele também critica a sociedade carioca que vive pela vaidade e futilidade.
- Em Quincas Borba, a filosofia do Humanitismo critica o cientificismo da época e revela a crueldade social disfarçada de racionalidade.
- Em Dom Casmurro, a ironia aparece como narrador: Bentinho tenta esclarecer o suposto adultério de Capitu, mas suas contradições só aumentam a dúvida.
Perceber a ironia é entender que o autor nunca dá respostas fáceis: ele faz o leitor rir, refletir e desconfiar ao mesmo tempo.
Leia devagar e aprecie as ambiguidades
A leitura de Machado deve ser lenta e atenta. Seus textos se constroem no que é dito e no que não é dito. É possível notar essa características em obras como:
- Em Missa do Galo, os gestos e pausas expressam mais do que as palavras.
- Em Dom Casmurro, a dúvida sobre Capitu é construída aos poucos, nas insinuações e contradições de Bentinho.
- Em Memórias Póstumas de Brás Cubas, os capítulos são curtos, deixando espaço para a reflexão. Cada vez que o narrador interrompe, ele quebra expectativas e isso cria novas camadas de leitura.
- Em Quincas Borba, Rubião tem uma moral ambígua. Ele é ao mesmo tempo vítima e vaidoso. Essa dualidade só fica clara quando o leitor lê com calma e percebe as nuances da história.
Ler devagar é aceitar o jogo de interpretações que o autor propõe, sem esperar respostas únicas e diretas.
Usar edições comentadas para facilitar a compreensão
Muitos elementos da obra de Machado conversam com o com o século XIX, as suas teorias científicas, debates filosóficos e costumes sociais. Para os leitores de hoje, pode ser um pouco desafiador entender essas referências.
Edições comentadas podem facilitar a compreensão do leitor e posicioná-lo no contexto histórico e filosófico das obras.
- Em Memórias Póstumas de Brás Cubas, as notas ajudam a entender críticas ao cientificismo e ao positivismo.
- Em Quincas Borba, o Humanitismo faz sentido completo quando comparado às ideias da época.
- Em Dom Casmurro, comentários explicam hábitos da elite carioca, práticas religiosas e expressões que já não usamos.
- Em O Alienista, as notas esclarecem o contexto dos debates científicos que o autor critica.
Edições comentadas funcionam como um guia entre o texto e o contexto, permitindo que o leitor compreenda a riqueza da escrita de Machado.
Em resumo, ler Machado de Assis pede uma leitura atenta. É importante notar a ironia e a estrutura da história, e sempre que puder, o apoio às edições comentadas. Seguindo essas práticas, o leitor poderá extrair o máximo da sua leitura.
Recomendação de edições e traduções
Depois de escolher por onde começar a ler Machado de Assis, é importante escolher edições confiáveis e comentadas. Essas edições oferecem o texto completo e recursos adicionais que vão ajudar durante a leitura.
Além disso, as traduções de qualidade são essenciais para leitores estrangeiros e divulgação internacional das obras, mantendo seu estilo e sentido.
Edições brasileiras
Uma boa forma de entrar no mundo machadiano são as edições comentadas da Companhia das Letras e da Penguin-Companhia.
Essas coleções se destacam pela qualidade crítica, pelas introduções de especialistas e pelas notas explicativas. Elas ajudam o leitor a entender os contextos históricos, sociais e filosóficos das obras.
A coleção da Penguin-Companhia é muito acessível. Cada volume traz o texto completo, além de prefácios, ensaios críticos e notas de rodapé.
Essas notas trás referências a autores, eventos do Segundo Reinado, expressões da época e até mesmo debates culturais. Isso enriquece muito a leitura de obras como O Alienista, onde a crítica à ciência fica clara com quando se entende o contexto.
Em Dom Casmurro, as convenções sociais do Rio de Janeiro são importantes para entender o conflito entre Bentinho e Capitu.
As edições da Companhia das Letras também são valiosas. Elas têm textos anotados, introduções e prefácios que combinam rigor acadêmico e acessibilidade.
Em Memórias Póstumas de Brás Cubas, as notas ajudam a entender as referências filosóficas e científicas, essenciais para entender a sátira da narrativa.
Em Quincas Borba, as notas ajudam a entender a filosofia do Humanitismo e sua relação com o positivismo.
Em Dom Casmurro, contextualizam costumes, religião e política do seu tempo, ampliando a leitura da ambiguidade de Capitu.
Traduções para leitores estrangeiros
A recepção internacional de Machado de Assis dependeu de traduções de qualidade. Essas traduções preservam sua ironia, ambiguidade e estilo. Entre as mais conhecidas estão:
- Gregory Rabassa, que traduziu Memórias Póstumas de Brás Cubas como The Posthumous Memoirs of Brás Cubas. Rabassa conseguiu manter o tom fragmentado e irônico da obra, preservando seu humor e inovação.
- Margaret Jull Costa e Robin Patterson, que traduziram Dom Casmurro para a coleção Penguin Classics. Essa versão é elogiada por sua fidelidade ao texto original e pela habilidade em recriar a ambiguidade do narrador Bentinho.
No mundo hispânico, traduções para o espanhol levaram o autor a toda a América Latina e à Espanha. Isso permitiu comparações com autores realistas como Benito Pérez Galdós e Clarín.
Já para falantes de francês, existem versões críticas de Memórias Póstumas e Dom Casmurro. Essas versões colocam o autor em diálogo com Flaubert e Stendhal. Elas destacam a narrativa sofisticada do autor.
Essas traduções foram muito importantes para colocar Machado de Assis como um autor do cânone mundial. Ele é lido e estudado em universidades e círculos literários em todo o mundo.
Elas ajudam leitores de outros países a entender sua ironia, profundidade e inovação. Isso coloca o autor ao lado de escritores como Dostoiévski, Henry James e Sterne.
Conclusão
Ler Machado de Assis é mais do que conhecer um grande escritor da literatura brasileira. É entrar em contato com um olhar claro e irônico sobre o ser humano e a sociedade. Suas obras atravessaram o tempo. Elas mostram as contradições, vaidades e fragilidades que ainda estão presentes hoje.
Começar por seus contos é uma boa forma de entender sua linguagem e temas centrais. Esses temas incluem amor, loucura, moral, poder e hipocrisia social. Os romances Dom Casmurro, Quincas Borba e Memórias Póstumas de Brás Cubas têm personagens interessantes. Eles também têm um estilo único.
Estes livros permitem que o leitor conheça melhor os personagens. A leitura, mesmo sendo desafiadora, traz uma compreensão melhor da condição humana e da literatura brasileira.
Machado de Assis não precisa ser lido rapidamente. Ele pede tempo, atenção e sensibilidade. Cada página convida à observação e um diálogo silencioso com o leitor. Por isso, o melhor ponto de partida é aquele que desperta sua curiosidade. Escolha o texto que o convida a seguir adiante, página após página.
E você, como vai começar a ler Machado de Assis? Deixe seu comentário abaixo. Compartilhe este artigo com outros leitores que querem conhecer o universo de Machado!
Referência Bibliográfica
SALOMÃO, Sueli Netto. Machado de Assis e o cânone ocidental: itinerários de leitura. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2022. Disponível em: https://books.scielo.org/id/4krgb. Acesso em: 26 set. 2025.
Perguntas Frequentes
Por onde começar a ler Machado de Assis?
A melhor maneira de começar a ler Machado de Assis é pelos contos curtos. Contos como A Cartomante e Missa do Galo apresentam bem o estilo irônico e psicológico do autor. Depois, avance para os romances realistas, como Memórias Póstumas de Brás Cubas, Quincas Borba e Dom Casmurro.
Quais contos de Machado ler primeiro?
Comece por A Cartomante, O Alienista, Missa do Galo e Uns Braços. Esses contos são curtos, acessíveis e revelam a genialidade do autor em combinar ironia, crítica social e profundidade psicológica.
Qual é o livro mais importante de Machado de Assis?
Embora todos os livros do autor sejam importantes. O livro de mais peso é Memórias Póstumas de Brás Cubas, publicado em 1881. O romance marca o início do Realismo no Brasil e traz o famoso narrador defunto, símbolo da ironia e da inovação literária machadiana.
É melhor começar pelos contos ou pelos romances?
Para quem está começando a ler Machado de Assis, é melhor começar pelos contos. Eles são mais curtos e ajudam o leitor a conhecer o estilo do autor. Assim, fica mais fácil ler os romances mais densos.
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